Cultivares desenvolvidas para a região, manejo adaptado e estudo das pragas locais são algumas das contribuições da Embrapa Agropecuária Oeste
O destacado papel de Mato Grosso do Sul no agro nacional deve-se muito ao trabalho científico, boa parte dele desenvolvido na Unidade de pesquisa da Embrapa, em Dourados, no sudoeste do estado. Criada em 13 de junho de 1975, cerca de dois anos após a criação da Embrapa, a instituição nasceu como Unidade de Execução de Pesquisa de Âmbito Estadual (Uepae) de Dourados, no então estado de Mato Grosso. Em 1993, fruto de uma demanda regional do setor agropecuário, a Uepae foi transformada em Centro de Pesquisa Agropecuária do Oeste (CPAO) e conhecida, logo após, pelo nome-síntese: Embrapa Agropecuária Oeste.
Hoje, ela compõe, com outros 42 centros de pesquisa, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa, que acaba de completar 50 anos.
As atividades desenvolvidas pela Unidade da Embrapa em Dourados começaram com o melhoramento genético para o desenvolvimento de cultivares adaptadas às condições locais. As pesquisas se concentraram em culturas como arroz, feijão, milho, algodão e, especialmente, nas de soja e trigo.
Os pesquisadores também se debruçaram sobre o manejo de pragas e doenças da região, adequação das épocas de plantio, conservação, correção e manejo da fertilidade do solo. Um marco relevante para a agricultura do estado foi a publicação, em julho de 1975, do documento Sistemas de Produção de Soja e Trigo, base técnica de consultas. A partir da década de 1980, novos projetos de pesquisa foram elaborados, focados em sistemas de produção e não apenas em culturas isoladas. Esses trabalhos desenvolvidos em parceria com os produtores tiveram como resultado o Sistema Plantio Direto (SPD). Técnica conservacionista por excelência, o SPD melhora a produtividade e a absorção da água pelo solo e reduz os custos de produção. A criação do Grupo de Plantio na Palha (GPP), em 4 de janeiro de 1994, em Dourados, constituiu-se em um importante fórum de discussões sobre o SPD .
As parcerias com o setor produtivo, universidades, cooperativas e demais segmentos produtivos da região, possibilitaram a aproximação das necessidades dos produtores, o que levou à implantação de melhorias no SPD com vistas a integrar, diversificar e melhorar a rentabilidade da propriedade. Essa ação culminou com a implantação, na década de 1990, do sistema de Integração Lavoura-Pecuária (ILP), ambos considerados pilares da agricultura de baixo carbono.
As pesquisas conduzidas pela equipe do centro, ao longo dos anos, possibilitaram a melhoria nos arranjos produtivos e na adaptação dos formatos de ILP mais adequados às necessidades e interesses dos produtores da região. Até hoje, a Unidade atua em pesquisas sobre sistemas de produção sustentáveis e adaptação às mudanças climáticas, sanidade agropecuária, segurança alimentar, desenvolvimento territorial e uso dos recursos naturais. A Embrapa Agropecuária Oeste tem um mandato de atuação ecorregional que abrange uma estrutura fundiária formada tanto por agricultores familiares como por produtores de grande porte integrados ao mercado de commodities.
Entre as atividades desenvolvidas, a equipe de profissionais desenvolve trabalhos em diversas culturas: consórcio milho-braquiária, soja, cana-de-açúcar, culturas de inverno e plantas de cobertura. Ela também participa no processo de validação de: algodão, mandioca, trigo, aveia e sorgo e realiza testes de viabilidade e potencial produtivo de girassol, amendoim, feijão-caupi, grão-de-bico, entre outras.
Mudanças climáticas
Localizada em uma região de clima tropical e com forte impacto das condições climáticas, que variam muito ao longo das estações do ano, a Unidade desenvolveu um sistema de coleta e disponibilização de informações agrometeorológicas como forma de subsidiar a tomada de decisão dos produtores rurais. Por meio de banco de dados organizado, sistematizado e on-line, o Guia Clima [Guia Clima – Temperatura, Umidade, Chuva, e outros dados climáticos. (embrapa.br)] é resultado do trabalho de pesquisa e desenvolvimento que auxilia diversos produtores rurais da região.
Trata-se de um sistema de monitoramento agrometeorológico que disponibiliza, em tempo real, dados sobre as condições meteorológicas (temperatura, umidade do ar etc.), informações (médias, normais etc.) e alertas (baixa umidade do ar, ventos fortes, geadas etc.), que podem ser usados para auxiliar na tomada de decisões, por meio de aplicativo em celulares. Abastecido por quatro estações agrometeorológicas, o Guia Clima possui potencial de ampliação e pode ser adaptado para outras cidades.
O conhecimento em agrometeorologia do centro de pesquisa permitiu que ele passasse a contribuir de forma contínua com as atividades do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Rede ZARC Embrapa), responsável pelo trabalho em parceria com o Ministério da Agricultura, Pecuária, que alimenta o banco de dados do sistema (SISZarc). Além das atividades de coleta de dados de pesquisa no campo, a equipe da Unidade realiza também o processamento e a modelagem dos parâmetros de culturas, estabelecendo as informações do ZARC. Os profissionais de Dourados também promovem reuniões de validação do ZARC. Maracujá, melancia, sorgo forrageiro, consórcio milho com braquiária são alguns exemplos de culturas e de sistemas produtivos que contam com ZARC em Mato Grosso do Sul, elaborado pela equipe de pesquisa da Embrapa Agropecuária Oeste.
Agroenergia
No início da década de 2010, a Embrapa Agropecuária Oeste começou a trabalhar com cana-de-açúcar, com o objetivo de desenvolver tecnologias para aumentar a produtividade e a qualidade da cana-de-açúcar na região Centro-Oeste do Brasil, que naquela época não era uma região tradicionalmente produtora dessa cultura. Atualmente, segundo dados da Biosul, o estado conta com 19 usinas de cana-de-açúcar e ocupa um importante papel no cenário sucroenergético brasileiro. Já foram produzidas quase 50 milhões de toneladas de cana em apenas uma única safra, um crescimento de 230%, responsável por colocar o MS na quarta posição de maior produtor de cana-de-açúcar do Brasil. Além disso, o estado é o quarto produtor de açúcar do País.
Esses números são reflexo do trabalho científico que possibilitou o uso e ocupação de ambientes restritivos com lavouras de cana-de-acúcar. Sobre esse tema, a equipe está desenvolvendo sistemas de produção que viabilizem a renovação de canaviais com adubação verde e com rotação de culturas, tais como crotalária [Crotalária é uma boa alternativa para a renovação de canaviais – Portal Embrapa] e soja.
A Unidade está atenta às demandas do RenovaBio, um plano nacional de biocombustíveis, e tem buscado se antecipar às necessidades do segmento, por meio de parcerias com cooperativas, iniciativa privada e associações de produtores, com destaque à Biosul.
Para isso, conta com o empenho da equipe de transferência de tecnologia da Unidade, que vem promovendo eventos frequentes voltados para o setor sucroalcooleiro. Esses seminários, atualmente denominados CanaMS, acontecem desde 2012 e contam com a participação de técnicos das usinas e interessados no assunto. Nessas reuniões, ocorrem amplas trocas de informações e captação de novas demandas de pesquisa aproximando a pesquisa do setor produtivo.
Peixes
Em 2004, a Embrapa Agropecuária Oeste criou o Núcleo de Pesquisa em Piscicultura, com o objetivo de contribuir com o fortalecimento da cadeia produtiva de pescados no Mato Grosso do Sul. Esse Núcleo desenvolve há 20 anos pesquisas em nutrição, genética, sanidade e manejo de peixes nativos e exóticos. Em 2006, foi inaugurado o Laboratório de Pesquisa em Piscicultura, que contou com o apoio financeiro da SEAP/PR e uma área de 247m2. O laboratório faz parte do Programa Integrado de Pesquisa em Aquicultura, que na época servia para pesquisas relacionadas à qualidade de água — monitoramento, manejo e medidas de controle; a nutrição e alimentação — requerimentos nutricionais para espécies nativas, manejo alimentar, fontes proteicas de origem vegetal e fontes energéticas — e a sanidade — diagnóstico e controle de doenças.
Sustentabilidade ambiental
Por tratar-se de uma unidade de pesquisa ecorregional, uso e conservação de recursos naturais fazem parte das linhas de pesquisa desenvolvidas. Em relação à agroecologia, as pesquisas estão voltadas para produção de alimentos, solos de qualidade e sistemas de produção integrados. Trabalhos sobre a produção de alimentos orgânicos na Unidade tiveram início com o uso de mandalas, que são sistemas de cultivo que combinam hortaliças, plantas medicinais e flores em um mesmo espaço circular.
Há também pesquisas relacionadas às estratégias de conservação de Áreas de Reserva Legal (ARLs) e de Áreas de Preservação Permanente (APPs), por meio de Sistemas Agroflorestais Biodiversos (SAFs). Os SAFs são sistemas de produção agrícola que combinam a produção de culturas agrícolas e árvores em uma mesma área, visando à conservação do solo, à recuperação de áreas degradadas e à diversificação da produção agrícola. A Embrapa Agropecuária Oeste desenvolve pesquisas nessa área desde a década de 1990, com destaque para os SAFs com espécies frutíferas, que apresentam alto potencial de comercialização.
Recursos hídricos
Um dos maiores impactos da agricultura na qualidade dos recursos hídricos (água subterrânea e superficial) ocorre devido à possibilidade de sua contaminação com resíduos de agrotóxicos. Em função desse risco, a Embrapa Agropecuária Oeste trabalha em um projeto de monitoramento da presença de resíduos de agrotóxicos em águas superficiais de Mato Grosso do Sul, dos rios Dourados, Amambai e Ivinhema, considerados importantes fontes de captação de água para distribuição à população de alguns municípios e um recurso para manutenção da biodiversidade. O principal resultado gerado com o projeto é o monitoramento da qualidade da água com frequência quinzenal. Esse monitoramento serve como subsídio importante para identificar possível impacto das atividades agropecuárias na qualidade dos recursos hídricos.
De modo a viabilizar as análises laboratoriais, foi construído e equipado um laboratório referência em análise e monitoramento de resíduos de agrotóxicos em águas superficiais. Inaugurado em junho de 2019, o Laboratório de Análise Ambiental tem 361m2. Os recursos financeiros para a construção do novo laboratório e a aquisição dos equipamentos foram viabilizados por meio de parceria entre Embrapa Agropecuária Oeste, Ministério Público Federal (MPF/MS), Ministério Público do Trabalho (MPT/MS), Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul (MP MS) e Instituto de Meio Ambiente de Dourados (Imam).
Atualmente, os trabalhos da Unidade são orientados para continuar buscando soluções inovadoras para a agricultura tropical, com ênfase na produção de alimentos, fibras e energia de forma sustentável e integrada. O foco da Embrapa Agropecuária Oeste está em reduzir custos e utilizar insumos biológicos e alternativas que gerem menor impacto ambiental. Além disso, trabalha na elaboração de políticas públicas voltadas para a agricultura familiar e fortalecimento das cadeias produtivas locais.